Valéria A Gurgel
Nos jardins de nossas vidas há de tudo.
Terra fértil e arenosa onde o bem e o mal podem florescer ou morrer.
Sabemos que as ervas daninhas do ódio proliferam como pragas e plantas tóxicas do egoísmo se espalham, envenenando os canteiros férteis de nossa paz.
Há muitos pés totalmente perdidos pelos caminhos. Eles tentam crescer. Desejam se enraizar e subir de um jeito contorcido, querem se sobressair a qualquer custo. Encobrem a luminosidade do ambiente, como se o sol nascesse somente para eles!
Há sanguessugas por toda a selva de pedras. E muitas são carnívoras, assustadoras. É comum nossa natureza humana temê-las, rejeitá-las e às vezes, o jardineiro das emoções tenta insistentemente arrancá-las ou combatê-las por segurança, de uma vez por todas. Parece quase impossível essas espécies tão rudes sobreviverem em um mesmo canteiro pacífico, mas muitas sobrevivem.
É nessa temerosa cadeia natural da vida que estamos inseridos. E são inúmeras espécies de caráter raros, índoles exóticas, comportamentos agressivos que nascem em nosso meio, quase irreconhecíveis.
Por mais difíceis e improdutivas e ainda que nos pareça inúteis, algo tem a nos ensinar, a fortalecer nossas raízes profundas na luta pela sobrevivência.
Combater, debater, é mesmo perda de tempo. Tudo faz parte de um processo lento de transmutação individual. Como uma metamorfose de um ecossistema do crescimento evolutivo da consciência.
Entender essa realidade, ainda que aceitando ou não, nos ajuda a refletir; todos estamos inseridos na mesma natureza planetária, somos parte dela!
Cultivar um jardim é um exercício diário e primordial para entendermos as nossas próprias necessidades e debilidades. Afinal estamos todos plantados nessa Terra e precisamos testar a nossa capacidade de resistência, de sobrevivência, adaptação e resiliência.
Há tempo para tudo. E de nada adianta insistirmos na antecipação ou na tentativa frustrada em adiar ou interromper esse processo de desenvolvimento e maturação. Há frutos que amadurecem, outros que apodrecem, outros sequer nascem.
A impermanência é atributo da vida. Entender e aceitar isso é saber que não podemos parar o vento, mas podemos voar em favor dele, e não contra ele! É saber ser leve, para se deixar fluir...
Sim, somos como as plantas. Como árvores, como flores de diversas cores, tamanhos, força, fragilidade, olores. Cada um dá aquilo que possui. E a sua resistência ou resiliência é proporcional as suas raízes, sua estrutura emocional.
Uns possuem raízes profundas, outros são como plantas rasteiras. Uns dão frutos doces, outros bastante amargos. Outros nem frutos dão. Há os que possuem muitos espinhos pequenos, médios e grandes e podem nos ferir. Isso é fato, é visível. Não temos por que contestar.
A delicadeza coaduna com a aspereza a todo momento. Até entre as pedras percebemos isso. Há aquelas foscas e as que parecem nascer com brilho próprio. E tem mais valor por isso. Há seres que parecem mais duros que as pedras brutas, toscas, deslapidáveis!
Há muitas dessas pedras pelo caminho! Algumas até nos auxiliam, mas muitas nos atrapalham... sigamos com atenção, o foco no autocuidado, auto-observação para não nos ferirmos por demais e sempre espalhando boas sementes, cultivando a nossa pura essência...
A essência de uma vida bem regada é o que nos possibilita viver e conviver entre as diferentes espécies nos jardins de nossa sublime e preciosa existência.
As sutilezas da natureza permeiam entre a luz e as trevas. O brilho do sol sempre resplandece mesmo entre os charcos.
Seja a delicadeza, a indelicadeza, a robustez, a fragilidade, o amargor, a doçura, a amabilidade, a aspereza… bom é saber que:
"Nem tudo na vida são flores, mas, quando for, regue!"